GATO FEDORENTO FALADO POR TODOS 4
Paralelo 35: Ainda o casamento entre homossexuais
A posição de Marcelo Rebelo de Sousa sobre o aborto eternizada pela sátira dos Gato Fedorento ilustra perfeitamente o paradoxo da nossa sociedade: É legal? Não. Pode-se fazer? Pode. O que acontece? Nada.
Fiquei extremamente surpreendido quando há três semanas li, aqui neste mesmo espaço, um artigo do Pedro Roma a retirar importância à proposta do José Sócrates sobre a legalização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.
Até aceitaria uma opinião contra, mas gastar um espaço de opinião onde se podem lançar ideias e discutir assuntos importantes para dizer que há coisas mais importantes para discutir sem ter uma posição é fazer exactamente aquilo que se critica. Se não é relevante discutir um assunto, não se alimenta, fala-se do que é importante.
Para mim, é importante, pois representa a aceitação da sociedade para as escolhas pessoais dos seus cidadãos, que assim se libertam do preconceito e da vergonha.
Esta mensagem é tão importante como a regulação de conflitos ou benefícios para o casal tornados possível através do enquadramento legal de milhares de cidadãos portugueses do mesmo sexo que vivem em união de facto.
O Estado não se deve ingerir nas escolhas livres e pessoais de cada um, mas sim regular essas escolhas, de forma a tornar a vida o mais feliz possível aos seus cidadãos, com especial atenção para as minorias.
Estes assuntos têm mais a ver com a capacidade de cada um em aceitar e respeitar os outros do que propriamente com orientações de esquerda ou direita.
Talvez pelos grandes partidos portugueses se resguardarem em assumir posição é que muitas pessoas aderem a partidos que, não tendo uma orientação de governo, vivem de eleitorado que se revê somente num ou dois pontos da sua linha política.
Um país que é capaz de, numa altura de crise, levar uma semana a discutir se o penalty que permitiu ao Porto empatar contra o Benfica foi legal ou não (diga-se de passagem que foi um roubo), comporta certamente um debate desta natureza. O problema não está na discussão, mas sim na ausência dela.
E deixava uma citação de Sá Carneiro que acredito encaixar-se perfeitamente: «Cabe-nos cada vez mais dinamizar as pessoas para viverem a sua liberdade própria, para executarem o seu trabalho pessoal, para agirem concretamente na abolição das desigualdades. Para isso mais importante que a doutrinação, é levar as pessoas a pensarem, a criticarem, a discernirem».
Estes assuntos são muito complicados de debater, ter uma posição não é difícil, assumi-la publicamente é que é.
*Biólogo Marinho
in: barlave online